BRASÍLIA - O ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres negou, nesta terça-feira (10), que planejou uma viagem para os Estados Unidos como forma de “coincidência” com os atos de 8 de janeiro de 2023. Ele contou que tirou “férias programadas” com sua família e viajou com medidas de segurança assinadas. 

Torres afirmou que planejou a viagem em julho de 2022, mas não realizou pela “sobrecarga” de trabalho. Na época, ele era ministro no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Depois, contou que fez uma promessa para suas filhas para viajar nas férias escolares, quando já ocupava a chefia da SSP-DF.  

"Eu comprei as agens em novembro de 2022, quando não tinha tido nenhum tipo de manifestação violenta no DF. Não foi coincidência, foram férias com a minha família, programadas para tirar. Eu já estava com as férias marcadas desde julho”, disse.  

Ele falou em depoimento no Supremo Tribunal Federal (STF), como réu na ação penal por golpe de Estado. Torres viajou para os EUA na noite de 6 de janeiro de 2023, dois dias antes dos ataques às sedes dos Três Poderes. As férias oficiais dele começariam somente três dias depois, em 9 de janeiro. 

No interrogatório, Torres contou que fazia acompanhamento de inteligência, especialmente do acampamento em frente ao Quartel-General do Exército, e até o dia 6, não havia informação da chegada de ônibus a Brasília ou"de que a manifestação ia caminhar para o que caminhou”. “Nós não tínhamos relatos de que a coisa tomaria o rumo que tomou do dia 7 para o dia 8”, afirmou. 

Também foi na tarde do dia 6 que Torres assinou o protocolo de ações integradas para segurança no DF, que disse não ter sido cumprido, nos ataques, por uma “falha grave”. O documento previa, por exemplo, o fechamento da Esplanada dos Ministérios e o isolamento da Praça dos Três Poderes, espaços ados pelos manifestantes.  

O ex-ministro contou que viajou “tranquilo” após vez imagens de esvaziamento do acampamento em frente ao QG do Exército. Já no dia 7, dos EUA, recebeu mensagens de sua equipe de “estava tudo certo em Brasília”. 

"Eu viajei, de certa forma, tranquilo. Eu tinha deixado esse protocolo assinado. Eu viajei adotando todas as providencias que o secretário de Segurança Pública tem que tomar, principalmente deixando esse protocolo de ações integradas assinado”, declarou. 

No momento do ataque aos prédios públicos, Torres disse que estava no parque da Disney e que ou a ligar para autoridades do DF “desesperado”, mas não foi atendido. Uma dessas pessoas era o ex-secretário-executivo da SSP-DF Fernando de Souza Oliveira, que disse ter deixado responsável pelo cargo. 

Celular e dólares perdidos 

Ao STF, Anderson Torres também negou ter extraviado seu celular pessoal na volta dos EUA para o Brasil, quando teve sua prisão decretada após os atos de 8 de janeiro. Ele contou que perdeu o aparelho após ficar “absolutamente transtornado” e “perder o equilíbrio” pela situação. 

“Eu perdi meu telefone naquele momento. Eu saí do DF como secretário saiu minha prisão. Isso me deixou absolutamente transtornado. Eu perdi totalmente o equilíbrio. A realização de um sonho se tornou um pesadelo para mim e, nesse contexto, eu perdi o meu celular, perdi uns dólares”, relatou. 

Torres afirmou que a perda foi ruim para sua defesa. “Ali tinha muita coisa que me ajudaria, mensagens desesperadas que eu mandei para o secretário adjunto”, frisou. 

PGR apontou Torres por participação em live de Bolsonaro  

Anderson Torres foi ministro da Justiça no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), entre março de 2021 e dezembro de 2022. Em seguida, assumiu como secretário de Segurança Pública do Distrito Federal. Ele ficou nomeado no cargo entre os dias 2 e 8 de janeiro e foi exonerado pelo governador Ibaneis Rocha (MDB) após os ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília.  

Ele virou réu por decisão da Primeira Turma do STF em 26 de março, junto ao chamado “núcleo crucial”, que tem Bolsonaro. De acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR), Torres utilizou o cargo para atacar instituições, com foco no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).  

Um desses episódios, segundo a denúncia, foi em uma live realizada por Bolsonaro no Palácio da Alvorada (residência oficial em Brasília) em julho de 2021 para questionar o sistema eleitoral. Na transmissão, Torres leu um documento recomendando o voto impresso.  

O parecer da PGR também apontou papel de Torres na operação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) nas eleições de 2022. Na época, denúncias deram conta de blitz montadas para dificultar o o de eleitores às urnas, especialmente na região Nordeste, onde Bolsonaro poderia perder para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).  

Também foi na casa de Torres, em Brasília, que a Polícia Federal (PF) encontrou uma suposta minuta de golpe de Estado, assunto que embasa a ação penal no STF. Em janeiro de 2023, ele alegou que, quando ministro, se depara com “sugestões e propostas dos mais diversos tipos” e que a minuta estava para “descarte” e seria “triturada”.  

Já na chefia da SSP-DF, Torres estava fora do Brasil no dia 8 de janeiro de 2023, quando prédios públicos foram invadidos e depredados. O então secretário viajou para os Estados Unidos com sua família na noite de 6 de janeiro, três dias antes do início oficial de suas férias.  

Os crimes atribuídos a ele são os de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Somadas, as penas podem chegar a 43 anos de prisão.