Sem a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) para uma nova prorrogação do prazo que Minas Gerais volte a pagar a dívida de cerca de R$ 165 bilhões com a União, a Assembleia Legislativa (ALMG) aprovou, nesta segunda-feira (15/07), em 1° turno, o texto-base da adesão do Estado ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). Sem os 39 votos necessários, o teto de gastos, fatiado do projeto original e um dos pré-requisitos para concluir a adesão ao RRF, não foi votado após manobra da própria base do governo Romeu Zema (Novo).
Apesar de ter reunido votos suficientes para aprovar o texto-base - Projeto de Lei 1.202/2019 -, os deputados estaduais da base de Zema derrubaram o quórum da reunião quando o teto de gastos seria votado - Projeto de Lei Complementar 38/2023 . Ao contrário do texto principal, que foi aprovado com maioria simples, 33 votos favoráveis e 20 contrários, a fatia, que é um projeto de lei complementar e não ordinário, exige maioria qualificada para ser aprovada, ou seja, 39 votos favoráveis, seis a mais do que teve o Palácio Tiradentes para aprovar o texto-base.
O líder do governo, João Magalhães (MDB), itiu que não tinha os votos necessários para aprovar o teto de gastos em razão do início do recesso, que, regimentalmente, é na próxima quinta (18/07). "Alguns deputados programaram de viajar com a família e, infelizmente, não havia como desmarcar. Com a necessidade da votação do projeto de lei de adesão ao RRF, nós colocamos em pauta sabendo que o número de deputados seria inferior ao necessário para a votação do teto de gastos. Então, nós já sabíamos de antemão que não teria quórum para a votação do teto", reconheceu Magalhães.
Quando o presidente da ALMG, Tadeu Martins Leite (MDB), o Tadeuzinho, anunciou que o teto de gastos seria votado, os deputados da base do governo começaram a deixar o plenário. Então, o líder do governo pediu o encerramento de plano da reunião, quando as chamadas para a recomposição não são feitas. Em seguida, a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), oposição a Zema, pediu a recomposição, quando um a um dos parlamentares é chamado pela Mesa Diretora para saber quantos deputados estão presentes. Sem o número suficiente, a reunião foi encerrada.
Assim como já havia feito mais cedo o líder da oposição, Ulysses Gomes (PT), Beatriz reiterou que o governo Zema não tem os votos para "aprovar o RRF na sua totalidade". "O governo tem na sua base 56 deputados e deputadas e ele conseguiu o máximo de 33 deputados. Essa é uma primeira observação", enfatizou a deputada. "A segunda é que o governo trabalhou contra a prorrogação (do prazo). É isso o que a gente observa ao ver as dificuldades que o governo teve em avançar na negociação entre dezembro de 2023 e julho de 2024, e, portanto, tentou forçar a adesão ao RRF", emendou ela.
Embora a adesão ao RRF esteja dividida em dois textos, Magalhães afirmou que a Advocacia Geral do Estado (AGE) entende que, até o próximo sábado, basta apenas a aprovação de um, o texto-base, que, segundo ele, é o que, na prática, autoriza a adesão ao RRF. "Nós estamos autorizando a adesão ao RRF. O teto de gastos é apenas um complemento. Acho que a gente pode aguardar mais uns 15, 20 dias até o mês de agosto, quando o time (de deputados da base) vai estar completo. Vamos aguardar", avaliou o líder do governo, que acrescentou que a tese da AGE "é defensável".
Questionado sobre o entendimento, Tadeuzinho ponderou que quem decide a estratégia é o governo. "Eu só pauto", pontuou o presidente da ALMG. "Se o governo encaminhou os dois projetos, eu entendo que os dois, em algum momento, são importantes para a discussão do RRF. Mas não tenho dúvidas que o principal projeto para a discussão do RRF foi aprovado em 1° turno, que é a autorização da adesão, que é o que o governo desde o início estava trabalhando e tramitando. Se a AGE tem um entendimento ou outro, é um trabalho que o governo terá de fazer", apontou o deputado.
Tadeuzinho ainda reforçou que nenhum dos 77 deputados, "inclusive eu", gostaria de votar a adesão ao RRF. "A ALMG fez de tudo, desde o ano ado, quando entendemos que este projeto aumentaria a dívida pública de Minas Gerais (de R$ 165 bilhões para R$ 210 bilhões), para tentar um novo caminho, que vem se avizinhando e sendo construído no Congresso. Só que, também, eu sempre deixei claro o posicionamento desta Casa sobre a questão de que, se nós não tivéssemos mais tempo ou um novo caminho, não cabe no orçamento do Estado uma parcela de R$ 6 bilhões", ponderou.
A AGE pediu que o prazo seja prorrogado até 28 de agosto, quando o mérito da última liminar que estendeu o prazo até o próximo sábado (20/07) será analisado pelo plenário do STF, ou, então, até a regulamentação da alternativa ao RRF apresentada pelo presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD), o Programa de Pleno Pagamento da Dívida dos Estados (Propag). O programa - Projeto de Lei Complementar (PLP) 121/2024 - aguarda a análise do plenário do Senado e ainda ará pelo crivo da Câmara dos Deputados.
Tramitação. Os planos do governo Zema são aprovar em 2° turno até o próximo sábado apenas o texto-base. Após a aprovação em plenário em 1° turno, o texto logo foi para a Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO), onde iniciou a tramitação em 2° turno. Entretanto, o relator e presidente da FFO, Zé Guilherme (PP), apenas distribuiu o parecer em avulso. Como o regimento interno da ALMG exige um intervalo de, no mínimo, seis horas para que o relatório seja votado neste caso, o texto-base voltará à comissão nesta terça (16/07), às 10h30.
Além de propor a redução de incentivos fiscais apenas depois do fim do mandato de Zema, o plano de recuperação fiscal apresentado ao Tesouro Nacional projeta somente duas recomposições salariais aos servidores públicos em nove anos e o congelamento dos concursos públicos após 2024. O governo, por sua vez, aponta que as medidas são apenas projeções e podem ser alteradas "a depender da situação fiscal do Estado e dos índices inflacionários reais" e da "comprovação da necessidade da realização de novos concursos".
Intimação da PGR não estava na conta 6v4t63
À espera de uma manifestação do presidente interino do STF, Edson Fachin, ainda nesta segunda, a base do governo já havia derrubado a reunião extraordinária anterior. Porém, o ministro, em vez de proferir uma decisão, intimou a Procuradoria Geral da República (PGR) a se manifestar, até a próxima quarta (17/07), se concorda ou não com a prorrogação do prazo solicitada pela AGE na última terça-feira (09/07). Zema chegou a ligar para o procurador geral da República, Paulo Gonet, para pedir que priorize a manifestação, e teria ouvido que a PGR seria célere.
Fachin intimou a PGR logo após se reunir com Zema em uma videochamada. O secretário de Governo, Gustavo Valadares, que participou do encontro, disse que o Palácio Tiradentes argumentou que a nova extensão não traria qualquer prejuízo à União. “Nós já comprometemos e já tínhamos avisado ao Tesouro Nacional que nós pagaríamos as parcelas para o restante do ano como se estivéssemos ou se nos mantivéssemos dentro do RRF. Então, não haverá prejuízo nenhum à União. Ele entendeu perfeitamente”, afirmou Valadares.
A PGR foi o terceiro órgão a ser intimado pelo presidente interino do STF desde que o Estado pediu a nova prorrogação. A Advocacia Geral do Senado se manifestou favorável à extensão, e a Advocacia Geral da União (AGU) não se opôs, mas reivindicou que o Estado pague as parcelas do serviço da dívida, ou seja, os juros e os encargos como se a adesão ao RRF estivesse concluída. A AGE, por sua vez, se mostrou disposta a pagá-las e reiterou o pedido por uma audiência de conciliação com o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).