BRASÍLIA – A família do tenente-coronel Mauro Cid deixou o Brasil no fim de maio, pouco antes do interrogatório dele e de outros sete réus do chamado “núcleo crucial” na ação penal sobre a suposta trama golpista. Parentes do militar seguiram para Los Angeles (EUA), em um voo com escala no Panamá.

Em 30 de maio, os pais do ajudante de ordens de Bolsonaro, Agnes Barbosa Cid e o general Mauro Lourena Cid, a mulher, Gabriela Santiago Ribeiro Cid, e uma das filhas viajaram para os Estados juntos. Eles não têm restrição para deixar o Brasil. 

A defesa do ex-auxiliar de Bolsonaro diz que a família foi comemorar a formatura do sobrinho mais velho e a festa de aniversário de 15 anos de outra sobrinha de Mauro Lourena Cid. O irmão dele mora nos EUA desde 2002. A volta está prevista para 20 de junho.

Mauro Lourena Cid, Gabriela e a filha adulta dela são investigados e tiveram processos suspensos após o tenente-coronel Mauro Cid firmar acordo de colaboração premiada. Caso ele descumpra uma das cláusulas, seus parentes voltam à condição de investigados.

Foi a descoberta dessa viagem da família aos EUA que levou o procurador-geral da República, Paulo Gonet, a enviar representação ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo medidas contra o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Gonet pediu as prisões de Mauro Cid e do ex-ministro do Turismo Gilson Machado, que teria atuado para obter um aporte português para o militar fugir do Brasil – réu e delator da suposta trama golpista, Cid teve o aporte brasileiro confiscado, justamente para não sair do Brasil. 

Alexandre de Moraes expediu mandado de prisão contra Mauro Cid, mas revogou a decisão, substituindo-a por mandado de busca e apreensão, cumprindo pela PF na manhã desta sexta-feira (13), em Brasília. Apesar da revogação da prisão, o militar foi levado para a sede da PF, para prestar um novo depoimento. 

Também na manhã desta sexta, mas em Recife (PE), agentes prenderam Gilson Machado. Na terça (10), a PF pediu a abertura de investigação de Gilson, sob suspeita de ter agido para tentar obter um aporte português para Cid. A PGR se manifestou favorável ao início da apuração e Moraes concedeu a autorização. 

A PF diz haver indícios que o ex-ministro foi em maio ao Consulado de Portugal em Recife, onde mora, para viabilizar o aporte a Cid, mas sem sucesso. No entanto, a PF apontou a possibilidade de ele procurar outros consulados ou mesmo a embaixada portuguesa, em Brasília, com o mesmo objetivo.

Segundo a PGR, há “elementos sugestivos” de que o ex-ministro tenha atuado para “obstruir a instrução” da ação penal que investiga se Cid, Bolsonaro e outros tentaram aplicar um golpe de Estado no país, além de outras investigações, como o caso das joias.

“Possivelmente para viabilizar a evasão do país do réu MAURO CESAR BARBOSA CID, com o objetivo de se furtar à aplicação da lei penal, tendo em vista a proximidade do encerramento da instrução processual”, completa a PGR.

STF suspendeu ações contra pai, mulher e filha de Cid por causa de delação

Investigação da PF revelou que Cid transportou para os EUA jóias ganhas por Bolsonaro na condição de presidente da República. O pai do ex-ajudante de ordens, o general Mauro Lourena Cid, seria o responsável por vender as joias nos EUA e guardar o valor obtido com elas.

Pai e filho itiram as condutas, que configuram, em tese, os crimes de peculato e lavagem de dinheiro. Mauro Lourena Cid contou ter levado dinheiro vivo, apurado com a venda das joias, a Bolsonaro. 

Já a esposa, Gabriela Santiago Cid, e a filha adulta dela, foram investigadas por causa de esquema de falsificação dos cartões de vacinação comandados por Mauro Cid. Mesmo sem terem tomado vacina contra covid-19, constava no ConecteSUS que o tenente-coronel, a mulher e as três filhas do casal estavam imunizadas contra o coronavírus.

O objetivo de Cid, conforme confessou o militar, era conseguir um documento para que todos conseguissem viajar aos EUA sem ter tomado a vacina, em meio à pandemia de Covid-19, quando o país exigia o comprovante de vacinação para estrangeiros. Antes de a fraude ser descoberta pela PF, Gabriela Cid usou o documento três vezes para entrar nos EUA.

No acordo de delação premiada, o ex-ajudante de ordens pediu pena máxima de prisão de dois anos, e que os benefícios dele acordados com a PF se estendessem para o pai, a esposa e a filha que tem mais de 18 anos. Foi firmado também, pela colaboração, restituição de bens e valores apreendidos em operação da PF, e ação da PF para garantir a segurança dele e dos familiares.

Cid conseguiu cidadania portuguesa em 2024, mas não o aporte

Em fevereiro, Alexandre de Moraes intimou a defesa de Mauro Cid para esclarecer “por qual razão o colaborador solicitou aporte português” e se ele já havia obtido o documento.

A defesa comunicou ao STF que o militar deu entrada em um pedido de cidadania portuguesa em 11 de janeiro de 2023, “única e exclusivamente pelo fato de que toda a sua família já possuía cidadania portuguesa”.

Cid conseguiu a carteira de identidade portuguesa em 2024. O documento é válido apenas em Portugal, mas não pode ser usado para cruzar fronteiras.

“O peticionante não solicitou e não possui aporte português (europeu), esse sim, documento que lhe permitiria, caso possuísse, viagens por qualquer país integrante da União Europeia ou outros países que tenham acordos de livre circulação com a UE”, alegou a defesa na petição.

Já Gilson Machado negou que tivesse tentado obter o documento para Cid. Disse que procurou o consulado para tratar do aporte de seu pai. Gilson foi ministro do Turismo de 2020 a 2022. Era um auxiliar próximo de Bolsonaro e se tornou conhecido também por tocar sanfona nas lives semanais do então presidente.