O presidente do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto, e outros três suspeitos permanecerão presos após terem ado por audiências de custódia nesta sexta-feira (9), em decorrência da operação Tempus Veritatis da Polícia Federal (PF), deflagrada na última quinta-feira (8). A investigação apura "tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito".

Valdemar foi ouvido na tarde desta sexta-feira por videoconferência, estando detido na Superintendência da PF em Brasília desde a manhã de quinta-feira (8). Embora o ministro Alexandre de Moraes não tenha autorizado mandado de prisão preventiva contra o presidente nacional do PL, ele foi preso em flagrante por porte ilegal de arma, após agentes da PF encontrarem uma arma sem registro e uma pepita de ouro durante cumprimento de mandados de busca e apreensão em sua residência.

Outros três detidos de forma preventiva, por determinação de Moraes, também prestaram esclarecimentos por meio de videoconferência: Filipe Martins, ex-assessor especial da Presidência da República; Marcelo Câmara, ex-ajudante de ordens; e Rafael Martins, major das Forças Especiais do Exército.

O ministro do Supremo autorizou a prisão preventiva de Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército, porém, ele se encontra fora do país. O militar foi enviado aos EUA pelo comando do Exército em 30 de dezembro de 2022. A PF solicitou sua imediata volta ao Brasil, além da entrega do aporte.

Operação Tempus Veritatis 

A PF deflagrou na manhã de quinta-feira (8) uma operação que visou buscar provas em investigação que apontam para uma “tentativa de golpe de Estado” em 2022, que estava sendo organizada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O plano impediria a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e manteria o ex-presidente no poder, de acordo com a instituição.

Para conseguir os 33 mandados de busca e apreensão, as 48 medidas cautelares que podem incluem apreensão de aporte e/ou proibição de manter contato com os demais investigados, além das quatro ordens de prisão, a PF apresentou à Procuradoria-Geral da República (PGR) um relatório. O documento tem análises de investigadores, com material anexado e apresentado como prova.

O conteúdo inclui mensagens de textos e áudios, além de vídeos dos investigados. Na representação, a PF disse haver indícios de tentativa de que uma “organização criminosa” visava golpe de Estado e planejou a abolição violenta do Estado Democrático de Direito. 

Para a suposta trama criminosa, a PF apontou seis núcleos que disseminavam “a narrativa de ocorrência de fraude nas eleições presidenciais, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e, eventualmente, legitimar uma intervenção das Forças Armadas, com abolição violenta do Estado Democrático de Direito, em dinâmica de verdadeira milícia digital”.

O que diz a PF sobre o vídeo e a suposta ‘organização criminosa’

Para conseguir os mandados de busca e apreensão, além das ordens de prisão, para a operação de quinta-feira, a PF apresentou à Procuradoria-Geral da República (PGR) um relatório. O documento tem análises de investigadores, com material anexado e apresentado como prova. O conteúdo inclui mensagens de textos e áudios, além de vídeos dos investigados.

A representação da PF disse haver indícios de tentativa de que uma “organização criminosa” visava golpe de Estado e planejou a abolição violenta do Estado Democrático de Direito. 

A tentativa de golpe de Estado é considerada crime, com pena que varia de 4 a 12 anos de prisão , além da punição correspondente à violência empregada para a busca de tomada do poder – ou permanência no poder, caso a intenção seja beneficiar quem está nele.

Já a tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito ocorre quando alguém atua com violência ou grave ameaça para impedir ou restringir o exercício dos poderes constitucionais, como o STF. A punição vai de 4 a 8 anos de prisão, além da pena relativa à violência usada.

Para a suposta trama criminosa, a PF apontou seis núcleos que disseminavam “a narrativa de ocorrência de fraude nas eleições presidenciais, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e, eventualmente, legitimar uma intervenção das Forças Armadas, com abolição violenta do Estado Democrático de Direito, em dinâmica de verdadeira milícia digital”.

  • 1. Núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral

Forma de atuação: produção, divulgação e amplificação de notícias falsas quanto a lisura das eleições presidenciais de 2022 com a finalidade de estimular seguidores a permanecerem na frente de quartéis e instalações, das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para o golpe de Estado.

  • 2. Núcleo responsável por incitar militares à aderirem ao golpe de Estado

Forma de atuação: eleição de alvos para amplificação de ataques pessoais contra militares em posição de comando que resistiam às investidas golpistas. Os ataques eram realizados a partir da difusão em múltiplos canais e através de influenciadores em posição de autoridade perante a “audiência” militar.

  • 3. Núcleo jurídico

Forma de atuação: assessoramento e elaboração de minutas de decretos com fundamentação jurídica e doutrinária que atendessem aos interesses golpistas do grupo investigado. 

  • 4. Núcleo operacional de apoio às ações golpistas

Forma de atuação: a partir da coordenação e interlocução com o então ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, Mauro Cid, atuavam em reuniões de planejamento e execução de medidas no sentido de manter as manifestações em frente aos quartéis militares, incluindo a mobilização, logística e financiamento de militares das forças especiais em Brasília.

  • 5. Núcleo de inteligência paralela

Forma de atuação: coleta de dados e informações que pudessem auxiliar a tomada de decisões do então presidente na consumação do golpe de Estado. Monitoramento do itinerário, deslocamento e localização do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e de possíveis outras autoridades da República com objetivo de captura e detenção quando da do decreto de golpe de Estado.

  • 6. Núcleo de oficiais de alta patente com influência e apoio a outros núcleos

Forma de atuação: utilizando-se da alta patente militar que detinham, agiram para influenciar e incitar apoio aos demais núcleos de atuação por meio do endosso de ações e medidas a serem adotadas para consumação do Golpe de Estado.

PGR respaldou relatório da PF contra Bolsonaro e ministros

Todas as alegações da PF foram referendadas pela PGR, que enviou um parecer ao ministro Alexandre de Moraes, do STF. Ele decretou 33 mandados de busca e apreensão, quatro mandados de prisão preventiva e 48 medidas cautelares diversas da prisão. Entre elas, estão a proibição de manter contato com os demais investigados, suspensão do exercício de funções públicas e proibição de deixar o País.

Estes são os principais argumentos apresentados pela PF:

  • Bolsonaro efetivamente participou e não apenas ouviu falar sobre um plano de tentativa de golpe. Ele sabia de uma minuta de decreto com medidas para impedir a posse de Lula e mantê-lo no poder. O então presidente da República discutiu o teor da chamada “minuta do golpe” e pediu ajustes. 
  • A versão inicial previa a prisão dos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, do STF, além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, mas Bolsonaro pediu que os nomes de Pacheco e Gilmar fossem retirados, mas exigiu a manutenção do trecho que previa a realização de novas eleições.
  • Com as mudanças no texto original da minuta, Bolsonaro convocou generais e comandantes das Forças Armadas. Ele apresentou a minuta e pressionou os oficiais para aderir ao golpe. Apenas o comandante da Marinha colocou a tropa à disposição, segundo a PF.
  • Militares da ativa pressionaram colegas contrários ao golpe para tentar convencê-los a aderir ao movimento. Em uma das conversas recuperadas pela PF, o general Braga Netto, então ministro da Defesa, chamou o comandante do Exército, general Freire Gomes, de “cagão”.
  • Oficiais do Exército organizaram manifestações contra o resultado das eleições e atuaram para garantir que os manifestantes tivessem segurança. O movimento incluiu o acampamento em frente aos quartéis, onde, de acordo com a PF, militares ensinaram táticas de guerrilhas a civis.
  • O grupo mais próximo de Bolsonaro, incluindo ministros civis e militares, monitorou os os de Alexandre de Moraes, tocando informações sobre a agenda do ministro do STF. Esse núcleo da “organização criminosa” era comandado pelo ex-assessor especial de Bolsonaro Marcelo Câmara.
  • A intenção do monitoramento era garantir a prisão de Moraes, caso o golpe militar fosse concluído. Segundo as investigações, Marcelo Câmara tinha o “itinerário exato de deslocamento do ministro” nas semanas finais de dezembro de 2022.
  • Em dezembro de 2022, o então chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército, general Estevam Cals Theóphilo Gaspar de Oliveira, se reuniu com Bolsonaro no Palácio da Alvorada e disse que colocaria as tropas especiais nas ruas se ele publicasse a minuta do golpe.
  • Os mais fiéis aliados de Bolsonaro, como Mauro Cid, seu ajudante de ordens, ajudaram a articular e financiar os atos que levaram à invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro. Mensagens recuperadas pela PF mostram Cid dando orientações e oferecendo R$ 100 mil a uma major do Exército para ajudar na organização dos atos em Brasília.
  • O PL, partido de Bolsonaro, foi usado para financiar narrativas que atacavam as urnas eletrônicas. O partido contratou um instituto para elaborar um estudo questionando o resultado da eleição. Na sede da legenda, os policiais encontraram um documento para decretação do estado de sítio.