Após quase chegar a um acordo na reta final do governo Jair Bolsonaro (PL), as autoridades envolvidas na repactuação da tragédia de Mariana, ocorrida há oito anos na região Central de Minas, estão novamente otimistas pela do termo. As negociações se intensificaram em setembro e outubro e estão na reta final, após voltarem praticamente à estaca zero por divergências da equipe de Lula (PT) com pontos que estavam pacificados na gestão anterior. A expectativa de deputados federais de Minas e do Espírito Santo é que a do acordo ocorra em dezembro. Apesar de não se falar em um número fechado, a reparação tende a ser superior à de outra tragédia, a de Brumadinho, pela qual a Vale pagou R$ 37,8 bilhões.

A negociação é conduzida, atualmente, pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), em Minas. Informações de bastidores dão conta de que as negociações junto à Samarco e suas controladoras (Vale e BHP Billiton) entraram na reta final em 8 de novembro, após determinação do desembargador Ricardo Rabelo. Desde então, reuniões diárias entre as partes acontecem, apesar de os atingidos alegarem total desconhecimento dos termos tratados. 

“Esse acordo vem para suprir um problema que a Justiça não vai resolver. Tudo que foi feito lá atrás (pela Renova) não agradou a ninguém, nem as empresas, que já gastaram muito, mas gastaram mal. Estamos na fase final”, diz o procurador geral Jarbas Soares Júnior.

Sugestões

Em meio às negociações, o deputado federal Helder Salomão (PT-ES) apresentou um relatório temático, ao qual O TEMPO teve o, com 43 sugestões para serem incluídas no acordo. Algumas delas envolvem, inclusive, a aprovação e sanção de projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional. 

Um dos pontos defendidos pelos deputados é a construção de uma nova matriz de danos, que substitua a aplicada pela Renova. O cálculo da indenização, segundo ele, precisaria ser feito por instituições independentes, assim como a realização de estudos periódicos sobre a contaminação do meio ambiente e da população em decorrência dos cerca de 40 milhões de m³ de rejeitos despejados sobre o rio Doce.

Só na cidade

Apesar disso, conforme fontes consultadas pela reportagem, um dos pontos que causam divergência na mesa de negociações é o item 12 do relatório de Salomão. A ideia é limitar o uso do dinheiro da reparação em iniciativas voltadas às cidades da bacia do rio Doce e sua área costeira e marinha. 

No caso de Brumadinho, não houve essa limitação, o que permitiu a aplicação do dinheiro em outras obras, afastadas da bacia do Paraopeba.

“O Estado coloca aquele conceito de distribuição do recurso para qualquer parte de Minas. Isso vai ser um problema. O recurso não pode ser extrapolado para outros locais nem servir eleitoralmente para ações estranhas ao acontecido em Mariana”, critica o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), coordenador da Comissão Externa sobre Fiscalização dos Rompimentos de Barragens da Câmara.

Outras medidas recomendadas pelos deputados no relatório são a garantia de que o auxílio emergencial pago aos atingidos não será equiparado à indenização; a destinação de recursos para a implantação de três novos campi da Universidade Federal do Vale do Rio Doce, em Governador Valadares, Ipatinga e Colatina (ES); a criação de um programa de formação continuada de educadores da rede pública dos municípios atingidos; e a realização de obras de infraestrutura nas BRs 381 e 262, que am pelas regiões engolidas pela lama. 

Outras intervenções indicadas são o esgotamento sanitário e tratamento de água para os municípios da bacia do rio Doce e a instituição de um programa especial para as pessoas e comunidades do rio Doce e litoral capixaba, com garantia de 100% de cobertura de atenção primária à saúde, criação de centros de referência para assistência e monitoramento da saúde dos prejudicados. 

Calendário para pagamento atrasa negociações

Outro entrave de momento é o calendário de pagamento das indenizações. Foi justamente esse ponto que impediu a da repactuação no ano ado. As autoridades envolvidas cobram que as empresas desembolsem a maior parte do dinheiro de imediato, até porque a tragédia foi em 2015 e pouco foi feito em termos de reparação, segundo os atingidos. Um parcelamento muito extenso atrapalharia a recuperação ambiental, social e econômica das cidades afetadas.

O governador Romeu Zema (Novo) cobrou uma resolução célere. Na semana ada, em evento do Ministério Público, ele não citou a negociação diretamente, mas deu um recado. “É importantíssimo irmos para o lado do acordo, porque o litígio não é o melhor caminho”, disse.

Saiba mais

  • Atingidos. Joceli Andrioli, integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), afirma não haver qualquer participação da entidade nem de moradores nas negociações acerca da repactuação de Mariana. As autoridades sempre sustentaram que essas pessoas foram ouvidas nas etapas iniciais do novo acordo, o que, na visão de Joceli, é insuficiente. “O governo federal se comprometeu a pedir a quebra da cláusula de confidencialidade para poder dialogar e ar as informações com clareza. Mas até agora não conseguimos”, critica. 
  • Governo. A Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão informou, em nota, estar “empenhando todos os esforços na repactuação do acordo de reparação”. Segundo a pasta, Minas defende “os interesses da população atingida e dos municípios mineiros”. 
  • Empresas. A Samarco “reafirmou o compromisso com as comunidades e com o meio ambiente e segue empenhada na reparação integral dos impactos”. A empresa destacou que “participa efetivamente de amplas discussões técnicas, buscando a repactuação e a solução definitiva para os programas que compõem o Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC)”. De maneira individual, a Vale esclarece que “está comprometida com a repactuação e tem como prioridade as pessoas atingidas. Como parte do processo de negociação, está avaliando os termos da proposta, especialmente no tocante à celeridade, eficiência e definitividade ao processo reparatório”. Já a BHP adiantou que "está absolutamente comprometida com as ações de reparação e compensação". Portanto, a companhia garante que "participa ativamente das discussões de repactuação do TTAC e reforça que, desde 2015, esteve disposta a buscar, coletivamente, soluções que garantam uma reparação justa e integral aos atingidos".