Na década de 1970 o meio-campista Gérson, uma das estrelas do tricampeonato da Copa de 70, acabou protagonizando o comercial do cigarro Vila Rica cuja frase dita por ele virou lei. “Por que pagar mais caro se o Vila me dá tudo aquilo de um bom cigarro? Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também!”. Uma campanha semelhante provavelmente jamais seria veiculada nos dias de hoje, mas, desde então, a “Lei de Gerson” é usada para batizar o que rege o famoso “jeitinho brasileiro”, segundo o qual todos devem, de alguma forma, levar vantagem em tudo.

Na análise dos historiadores, o comercial resume bem como é impossível dissociar a corrupção no Brasil de fatos que construíram a história do país. A forma de colonização, a questão latifundiária, a escravidão, “acoplados à promiscuidade entre o poder público e o privado”, deixaram sequelas profundas na nossa sociedade, segundo a professora do Centro de Pesquisa e Documentação de História da Fundação Getúlio Vargas (FGV DOC), Dulce Pandolfi.

“Aqui, a Justiça sempre foi utilizada pela elite do pais, era quase uma instância privada. Outro aspecto bastante distorcido é o da polícia. De modo geral, o cidadão não a vê como garantidora dos seus direitos, não confia. Temos historicamente uma fragilidade da nossa cidadania, e a sociedade foi naturalizando esses valores. A elite, sempre cheia de privilégios, achando que está acima da lei e para manter seus privilégios, usava de repressão e corrupção”, analisa.

Atos corruptos não são privilégio do Brasil. Outros países como Estados Unidos e Alemanha já aram também por grandes crises, mas o que mais foi atingido nesses países foram as pessoas, e não as instituições, diz Dulce Pandolfi. “Quem cometeu os crimes foi punido, uma conduta bem diferente do Brasil. Aqui, a reforma política é a única solução”, afirma.

A doutora e professora em psicologia Nanci Gomes também acredita que “só há corrupto numa sociedade doente”. Em uma pesquisa desenvolvida no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP), Nanci analisou os aspectos psicológicos da corrupção, a ética e seus reflexos no serviço público. O estudo foi publicado em livro pela Lambert Academic Publishing, da Alemanha.

“Tanto o caráter quanto o modo de funcionar daquele ambiente, órgão ou instituição têm forte impacto na conduta ética desenvolvida no trabalho, na política ou no dia a dia. Porém, ambos, tanto a personalidade e o caráter das pessoas, quanto o modo de funcionar daquela organização, são o espelho do modo de funcionar mais amplo da sociedade”, diz.

Referência. A brasileira Camila Vicenci Witt mora na Dinamarca há três anos – a nação menos corrupta do mundo há 20 anos. Lá, Camila trabalha no setor de combate a lavagem de dinheiro, fraude e financiamento do terrorismo no maior banco dinamarquês, o Danske Bank. “É uma maneira de os bancos protegerem seus clientes. Aqui se tem uma ênfase grande na proatividade no combate à ilegalidade”, diz.

Camila diz que naquela sociedade existe uma igualdade muito maior de salários e que “é feio levar vantagem”. “A regra social é que ninguém é melhor que ninguém, e político é um servidor público. A classe política de cada país reflete a tolerância que a sociedade tem para com as ações corruptas. Em um caso recente, o povo exigiu a saída do primeiro-ministro porque ele estava usando dinheiro público para viajar de primeira classe”, conta.

CIA traça perfil

Putin é autista. Fidel Castro, egoísta. Kadafi tinha um distúrbio de personalidade, e Hitler era um masoquista. Uma equipe da Agência Central de Inteligência (CIA) dos Estrados Unidos vem analisando durante décadas os perfis psicológicos dos principais chefes de Estado do mundo.

O estudo baseado em métodos científicos, discursos, fatos biográficos e comportamentos observáveis já foi utilizado por diplomatas, estrategistas militares e até mesmo presidentes que recorreram a esses perfis para tomar decisões. O mais recente, embora tenha sido feito em 2008, foi divulgado apenas agora e refere-se ao líder russo, Vladimir Putin.

FOTO: AFP PHOTO/Alexander Zemlianichenko
Vladimir Putin
Perfil do chefe de Estado russo foi feito com base em análise de imagens


Na China, corrupção tem pena de morte

Enquanto no Brasil a corrupção tem pena de dois a 12 anos de prisão e multa, em alguns países a punição é mais severa e pode chegar à pena de morte, como é o caso da China. Apesar das diferentes condenações, a corrupção é um grave problema para os dois países. Ambos ocupam a posição de número 79 entre as nações menos corruptas do mundo – mesma classificação da Bielorrússia –, conforme último levantamento feito com 176 países e divulgado pela ONG Transparência Internacional em 2016.

A China lidera a lista dos cinco Estados que mais executam pessoas em todo o mundo, além de Irã, Paquistão, Arábia Saudita e Iraque. Segundo a ONG Anistia Internacional, esses territórios continuam a sentenciar pessoas à morte por corrupção iva e outros atos que o Ocidente considera crimes menores (adultério e blasfêmia). O governo chinês expandiu sua lei anticorrupção em 2010, e, embora os dados oficiais não tenham sido divulgados, a organização estima que mais de mil pessoas foram executadas em 2016. No mesmo ano, um relatório anual apresentado na Assembleia Nacional Popular revelou que o número de casos de corrupção julgados na China em 2016 chegou a 45 mil.

Desde a chegada ao poder do presidente Xi Jinping, a campanha anticorrupção lançada pelas autoridades chinesas traduziu-se em dezenas de milhares de condenações, incluindo figuras importantes, como o ex-ministro de Segurança Zhou Yongkang, condenado em 2015 a prisão perpétua.

Em outras partes do mundo, a corrupção também é encarada de outras formas. Em 2007, o ministro da Agricultura, Florestas e Pesca do Japão, Toshikatsu Matsuoka, suicidou-se após se envolver em um escândalo por suposta malversação de fundos públicos.

No ano ado, o ministro da Economia japonês, Akira Amari, renunciou após se envolver em um escândalo de corrupção revelado pela revista “Shukan Bunshun”. De acordo com o veículo, o ministro e seus assessores receberam suborno de ao menos 12 milhões de ienes (R$ 415 mil) de uma empresa de construção. A renúncia representou uma derrota para o governo do premiê Shinzo Abe.