Há oito anos, quando Belo Horizonte era uma das cidades sede da Copa do Mundo de Futebol realizada no Brasil, o cenário era de otimismo. O recém-inaugurado Move poderia levar em minutos os milhares de torcedores que iriam ao Mineirão, que também estava novinho em folha. Era o fim do trânsito de veículos e a confusão que sempre rodeou o estádio em dias de jogos, shows e festivais.
Mas a promessa ficou só no papel. Após o mundial, o o ao Mineirão se tornou novamente um problema e o transporte público, cujos investimentos deveriam ser duradouros, está longe de ser a preferência entre os torcedores que am o estádio.
Essa conclusão faz parte de um estudo feito em 2019 para a BHTrans - empresa responsável por gerenciar o trânsito em Belo Horizonte. Na pesquisa entregue à Gerência da Auditoria e Operações de Transporte da BHTrans, foi constatado que o uso do transporte particular é a preferência da maioria do público. Enquanto 48,7% optavam pelo carro, outros 19,6% usavam transporte por aplicativo para ar a região. Na mesma pesquisa, o ônibus foi citado como preferência por apenas 20% dos torcedores, enquanto o táxi tinha só 2,4% das menções. A BHTrans considera como transporte público ônibus, metrô e táxi. Na pesquisa, os outros 9,3% vão para o Mineirão de outras formas, como a pé, bicicleta e carona.
Após um intervalo de quase dois anos sem eventos devido a pandemia do coronavírus, a atividade no estádio foi retomada e a tendência é de um cenário ainda mais distante do prometido lá em 2014, como explica o consultor em trânsito, Silvestre Andrade. “Nos últimos anos, nós não pudemos avaliar essa questão devido ao cenário de pandemia e o estádio ficou fechado por muito tempo. Mas nessa retomada e diante do cenário de crise no transporte público, a percepção é de que a coisa ficou bem desorganizada”, critica o especialista.
Quem pega ônibus para ir ao Mineirão em dias de jogos e eventos tem do que reclamar. O Bruno Araújo, de 24 anos, usou o 55 - linha que atende exclusivamente os torcedores - e não gostou do serviço. “Geralmente eu venho de carro ou de carona com amigos, mas dessa vez não teve jeito e eu tive que vir de ônibus. Bom não foi não porque demorou demais para ar e, por conta disso, veio muito lotado”, resume o torcedor cruzeirense que ainda brinca. “Para o pobre, todo dia é um 7 a 1”, fazendo referência a goleada histórica sofrida pelo Brasil durante o mundial de 2014, justamente no Mineirão.
Tanto a lotação quanto a insegurança estão entre os fatores que afastam o público dos ônibus, segundo a pesquisa entregue à BHTrans. Entre os usuários que não iam de ônibus para o estádio, 56% afirmaram já ter usado o transporte, o “demonstra a existência de experiências que tenham marcado”, diz um trecho do estudo.
Falta estímulo
Segundo especialistas em trânsito e transporte público ouvidos pela reportagem, a prefeitura abandonou o ‘legado’ logístico da Copa do Mundo e se aproveitou apenas da nova estrutura montada a partir do Move e o novos os ao Mineirão reformado. O resultado foi o desuso gradual do transporte e o incentivo ao uso de carro, responsável por complicar o trânsito na região em dia de grandes eventos.
“A operação de trânsito naquela região funcionou bem durante a Copa do Mundo e, guardadas as devidas proporções, poderia funcionar também hoje em dia. Depois de vários acontecimentos ao longo desse período pós-copa de crises e demandas mais reduzidas e, talvez o desinteresse do próprio estádio de montar uma estratégia em conjunto, isso foi sendo deixado de lado”, avalia Silvestre Andrade, consultor de trânsito.
Para André Veloso, economista, especialista em transporte público e membro do movimento ‘Nossa BH’, o problema do Move não diz respeito só ao o ao Mineirão. “O Move parece ser um sistema de linhas alimentadoras separadas entre si. Se você quer pegar um Move na Cristiano Machado para descer no Centro e depois ir para a Antônio Carlos, você não consegue. Tem que descer da estação e pagar por uma outra linha”, explica Veloso, que completa. “Sem integração, o sistema não tem vantagem alguma em relação ao ônibus”, diz.
Para atender exclusivamente o Mineirão em dias de jogos, a BHTrans tem a linha 55 que parte no Centro de Belo Horizonte e vai para o estádio, seguindo pelo corredor exclusivo da Avenida Antônio Carlos. Em 2019, esse tipo de operação já era alvo de questionamentos por parte do estudo.
O primeiro questionamento era relacionado à distância. Segundo o contrato de transporte coletivo para mobilidade no Mineirão, a distância máxima para o ao serviço de ônibus deveria ser de 600 metros. No entanto, as estações mais próximas estão a 1,8 km de distância.
Outro ponto levantado pelo estudo foi a eficiência desse transporte exclusivo: durante um intervalo de eventos realizados no Mineirão em 2019, foi observado que a linha exclusiva operou com oito veículos e fez um número médio de 16 viagens, sendo oito de ida ao estádio e oito no sentido oposto. “De posse dos dados, observou-se que a linha 55 transporta, em média, 2,0% do público presente em jogos no Mineirão. Além disso, a frota é pouco reutilizada, ou seja, raros são os episódios em que algum veículo realiza uma segunda viagem por sentido, principalmente durante a saída do jogo, encerrando assim a operação rapidamente”, diz um trecho do estudo.
O que diz a BHTrans
Procurada pela reportagem, a BHTrans não informou qual é a quantidade de viagens e ageiros transportados pelas linhas que atendem o Mineirão. A empresa também alegou que investe em ações de estímulo ao uso do transporte coletivo “como a implantação de faixas exclusivas que priorizam a circulação dos ônibus e táxis, proporcionando mais rapidez no deslocamento”, diz o trecho da nota.
Em números
Custo total da reforma no Mineirão: R$ 677 milhões
Custo para implantação do Move: R$ 1,06 bilhão
Fonte: Governo de Minas e Prefeitura de Belo Horizonte