Para separar as impurezas da terra das coisas divinas, religiosos da idade média enfeitavam ruas com serragem, sal grosso, casca de ovo, folhagens e demais restos de natureza formando tapetes coloridos para que os padres pudessem caminhar com a imagem de Jesus. A tradição religiosa permanece até os dias de hoje, e no feriado de Corpus Christi, nesta quinta-feira (8), os tapetes coloridos renovam a fé dos fiéis das igrejas São José e Boa Viagem, no centro de Belo Horizonte.
"Cerca de um quilômetro liga os dois santuários pela avenida Afonso Pena. Nesse trajeto, voluntários, paroquianos e religiosos vão colorindo a pista com símbolos da fé cristã, como o Sagrado Coração de Jesus, imagens dos movimentos pastorais, além de agens emblemáticas da vida de Jesus", explica o coordenador do projeto, Renato Alves.
De acordo com o paroquiano, a serragem vem de doações de empresas da capital e cidades da região metropolitana. "A gente tinge a serragem com pigmento e álcool. São diversas tonalidades de que vão dando o colorido e revelando as imagens. Neste ano, a igreja São José terá que colorir até a entrada do Parque Municipal. De lá em diante, a responsabilidade é da Boa Viagem, mas, como é um momento de comunhão, quem terminar primeiro ajuda o outro, em solidariedade e união", acrescenta.
Pela primeira vez na confecção da arte santa, o designer gráfico Edenio Camilo tem experienciado unir trabalho, fé e voluntariado.
"É um pouco complexo tirar a ideia de uma superfície lisa e plana e ar para o asfalto. Tem um grau de dificuldade, mas é um desafio interessante", ressalta.
Vindo do Ceará, o turista quer levar a tradição para a terra natal e difundir a cultura mineira para o povo nordestino. "Lá (Ceará) é incomum este tipo de atividade. Vemos muito por aqui, principalmente nas cidades do interior. Quero levar para lá esse trabalho que é inspiração e coletividade", completa.
Já para a paroquiana Velmira Ilario, que há cinco anos participa da ação, fazer tapetes é sinônimo de união. "A gente sempre faz novas amizades. Sempre tem nova querendo participar e acaba entrando para a comunidade religiosa", afirma.
"Na natureza nada se perde, tudo se aproveita", disse Cida Botelho, uma das voluntárias, ao usar flores cor-de-rosa de um ipê para confecção do tapete. "A gente pegou esse presente da natureza e está usando aqui, mesmo que depois o vento leve, mas a gente aproveita essa beleza", garante.
Pandemia interrompe tradição por três anos
Nos anos de pandemia de Covid-19, a tradição religiosa ficou restrita a um pequeno tapete na escadaria do santuário. Hoje, com o controle da doença, o reitor da igreja, José Cláudio comemora a retomada das atividades.
"Nos últimos três anos, o tapete era só na escadaria. Agora, sem pandemia, a gente vai pela avenida com união e participação das pessoas nesta festa tão importante e bonita que é a celebração do Corpo do Senhor", diz.
Além da montagem dos tapetes, há uma programação de missas e procissão religiosas, além de adoração ao Santíssimo nas duas igrejas.